segunda-feira, 14 de março de 2011

C&G

-Sufocas me, Jorge! Nunca estarei à altura dos teus elevados padrões! Odeio tanta ordem! Odeio tanta exigência!Aos outros não aplicas tão rigorosos critérios!
- Estás transtornada. Aguardo que te acalmes lá fora, vou apanhar um bocado de ar, dar te espaço para recuperares...
- Cobarde!
- Volto em breve...
Este brevidade que Jorge previa não cumpriu.
Divagando pela rua, deu consigo dentro do carro, e encaminhando-se para a beira mar.
A esta hora, já se tinham recolhido as pessoas a seus lares, e trama e teia arborizadas dum tecido urbano burguês deixavam se percorrer pelo sentimento de incumprimento de Jorge. Sentia que falhava. Porque o seu casamento não era perfeito como planeara. Porque a promoção tão trabalhada não se concretizara. Porque vivia de "quases" e "ses", num eterno advir, sempre no futuro, sempre no passado, nunca no presente. O presente tornava se muito doloroso por ser real.

A maré vaza deixava adivinhar os contornos das rochas outrora submersas. Permitia que Luisa e Jorge transitassem por entre uma gruta e desaguassem numa pequena praia, emoldurada pela fogosa falésia. Tão alta escarpa subjugava-os, e remetia os para o mar, onde o olhar se estendia sem esforço, e podia fluir livremente. As tardes eram quentes, e os pequenos, pelo mar, eram livres.
Jorge e Luisa mal secavam o sal no corpo, e corriam novamente para o embalo doce do Atlantico.
Luisa cria que, se lhe fosse dado tempo suficiente, as pernas se fundiriam, cresceria barbatanas,e se tornaria sereia, cantando aos navegadores. Era este o chamamento, o canto encantado e inebriante do mar que a seduzia.
Jorge apreciava as gaivotas no ar. Jorge apreciava as gaivotas no mar.
- Porque chamarão "gaivota" a esta bicicleta marítima de dois lugares?